sábado, 26 de fevereiro de 2005

Nacionalidade: Passaporte


Estava inserindo as informações na base de dados, mecanicamente, como sempre o fazia.
Estava na fichinha número 52.
Inseriu o nome, o sobrenome e a partir daqui o pânico instalou-se.
No endereço dizia 9965654429; o telefone era Rua de Baixo n.º 7, Aveiras de Baixo; o número do passaporte referia "24/05/1963"; e, por fim, cereja do bolo, a sua nacionalidade informava "passaporte".
O funcionário suou.
Pensou, reflectiu, matutou.
Olhou para as outras 22 fichas que ainda tinha de inserir e que lhe sussurravam: "despacha-te, se não jantas aqui connosco na repartição, irá ser um prazer".
Voltou a olhar para a ficha rebelde.
Mirou o relógio.
Porque raio aquela pessoa tinha resolvido lhe tramar daquela maneira?
Deveria copiar tudo errado, da maneira como estava no papel, sua obrigação?
Ou deveria fazer uma cópia correctiva?
O primeiro procedimento era o mais acertado, apesar de um consulente desavisado poder julgar que o copiante havia surtado durante o exercício de suas funções.
A segunda alternativa o faria ultrapassar sobremaneira as suas obrigações.
E ainda havia mais a ponderar.
Não poderiam ser correctas as informações? Quem era ele para julgar se telefone parecia nome de rua, se o endereço parecia um número de telefone?
E a nacionalidade não poderia perfeitamente ser passaporte?
Olhou para o colega que estava ao seu lado direito e que se mantinha fichando tudo o que lhe passava pela vista.
Olhou para o colega da esquerda que furiosamente atacava o teclado do computador e que num pequeno momento dirigiu um olhar de interrogação, tendo, uma fracção de segundo depois, agarrado outra ficha, com rapidez meteórica.
Então o pobre funcionário, que não era pago para ter dúvidas existenciais, resolveu o problema da maneira que se resolvem as mesmas.
Deixou esta ficha para depois.

1 comentário:

Anónimo disse...

E por isso era funcionário.
Silvana
www.silby.theblog.com.br