quinta-feira, 18 de novembro de 2004

AACS Censura Gomes da Silva e Morais Sarmento

(ou Marcelo virou a mesa)
Por JOÃO PEDRO HENRIQUES
Quinta-feira, 18 de Novembro de 2004
No PÚBLICO
A Alta Autoridade para a Comunicação Social (AACS) concluiu ontem que configuraram uma "tentativa de pressão ilegítima" sobre o grupo Media Capital, proprietário da TVI, as declarações do ministro dos Assuntos Parlamentares, Rui Gomes da Silva, exigindo o "contraditório" aos comentários políticos que Marcelo Rebelo de Sousa fazia naquela estação.
Em relação a outras declarações de um outro ministro, no caso Morais Sarmento (ministro da Presidência, que detém a tutela dos media estatais, o qual considerou, nomeadamente, "haver limites à independência dos operadores públicos") a AACS considerou que as ditas declarações "afectam, no seu conjunto, a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder político e, especificamente, a independência dos órgãos de comunicação social pertencentes ao Estado, bem como a liberdade de programação e de informação e a autonomia das direcções de programação e de informação".
Estas foram apenas duas das conclusões que a AACS retirou do seu inquérito ao chamado "caso Marcelo", que acabou por transformar em inquirições sobre a concentração dos media. Ontem este organismo emitiu uma extensa deliberação sobre o caso (mais de 50 páginas), e os ministros Gomes da Silva e Morais Sarmento não foram os únicos a sair atingidos.
A AACS censurou expressamente o presidente da Media Capital, Miguel Paes do Amaral, considerando que a conversa que este teve com Marcelo Rebelo Sousa (e na sequência da qual o ex-líder do PSD se decidiu afastar da TVI) pode de facto "ser interpretável como condicionamento da colaboração do comentador". Considerou, por outro lado, que o presidente da Media Capital "infringiu a liberdade editorial legalmente protegida" ao conversar com Marcelo "sem a presença, a intervenção atempada ou sequer o conhecimento prévio" do director de informação da estação, José Eduardo Moniz. Na conferência de imprensa de ontem, destinada a divulgar as conclusões das inquirições, foi anunciado que a AACS não se decidiu por impôr coimas a Paes do Amaral por razões de "prudência e razoabilidade"-
PT instada a vender grupo Lusomundo
O processo da AACS abordou ainda o universo mediático da Portugal Telecom - a propósito, designadamente, da demissão do director do "Diário de Notícias", Fernando Lima -, tendo-se concluído por uma "recomendação". Tanto o grupo como o "accionista de referência que é o Estado" devem considerar uma de duas hipótese: ou a venda do universo mediático do grupo (DN, JN, TSF e vários outros órgãos de comunicação social); ou então, caso esta solução não seja posta em prática, que os "media" da PT sejam "colocados" na "área de atribuições e competências do órgão regulador" da comunicação social.
Na prática, a AACS pretende (se a PT não vender o grupo Lusomundo) ter o direito a dar parecer prévio à nomeação das direcções dos media do grupo, direito que actualmente só detém em relação aos órgãos de comunicação social de serviço público.
A AACS recomendou também que a si própria (ou ao organismo que lhe venha a suceder) sejam, de futuro, atribuídas competências de "regulação de operações de concentração", não ficando isso na exclusiva competência da Autoridade para a Concorrência.
Outra recomendação relaciona-se directamente com o DN, mais propriamente com o seu ex-director, Fernando Lima, que chegou à direcção do jornal vindo de um gabinete ministerial. Para a AACS é importante legislar no sentido de impedir estas transições directas, nomeadamente impondo períodos "razoáveis" de nojo entre funções jornalísticas e de assessoria.
O relatório ontem divulgado foi dividido em seis capítulos, sendo o penúltimo de "conclusões" e o último de "recomendação". Nas "conclusões", o presidente da AACS, o juiz conselheiro Armando Torres Paulo, votou sistematicamente contra, dizendo, por exemplo, que "não foi possível concluir, com um mínimo de segurança", que foi uma intervenção do Governo que levou Marcelo a deixar a TVI.
Já a parte da "recomendação" foi aprovada por unanimidade.

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