quarta-feira, 8 de outubro de 2003

Saudades do Manel

Não me leves a mal, se leres, mas tenho de contar a tua história, até porque já estou com saudades tuas. Troquei o teu nome e tudo.
O meu grande amigo Manel veio para Portugal há alguns anos, penso que já lá vão sete ou oito.
Ele veio dos Estados Unidos e era um canadiano filho de portugueses.
O Manel era um aluno e trabalhador exemplar. Passava as férias na Califórnia, para ganhar o dinheiro que ia gastar na Universidade e nas suas despesas pessoais durante um ano (!) em Portugal.
E todos os anos assim acontecia.
Era impressionante a maneira como ele vivia a Faculdade de Direito. Mais do que qualquer um dos alunos do nosso grupo. O gajo vibrava com aquilo tudo.
E assim foram passando os anos...
Não posso deixar de dizer que este ilustre senhor me apresentou uma terra espectacular, aonde ele tem família e onde ele passava todos os fins de semana. A Nazaré. Não, não é a Nazaré de Jesus, mas sim a Nazaré portuguesa, que aliás deve ser melhor e mais bonita que a de Jesus. E Jesus também andou por aqui, ou a mãe dele, conforme disse a toda a gente o Dom Fuas Roupinho. Bela terra Nazaré, com os seus "quartos, rooms, chambres, ..." para arrendar. Só indo lá para entender o significado desta expressão "quartos, rooms, chambres". Êta lugarzinho bom!
Volto ao Manel, pois não posso me perder pelas ruas da Nazaré, com os seus carapaus a secar ao sol. Carapau seco! O Manel contou-me que montes de emigrantes levam os carapaus na bagagem para terem o prazer de os saborearem longe de sua terra, com gosto de saudade (acrescento eu).
Mas o Manel então concluiu o curso, com uma média boa. E arranjou logo um estágio, aonde ganhava mais ou menos bem, para um advogado-estagiário.
Além disso, ele fez uma pós-graduação na qual teve excelentes notas.
Porém, o Manel, aqui, como trabalhador qualificado, recebia menos do que recebia nos Estados Unidos, fazendo os seus serviços de mecânico.
E lá, ainda tinha tempo de tocar a sua guitarra e estar com os seus amigos.
Por isso, ele resolveu atirar tudo para o ar e voltar para o seu país (que ele vai dizer que não é o dele).
Eu fiz força para que ele ficasse, um pouco egoísticamente, eu sei. Mas eu gostava muito dele, o que fazer?
No entanto, não é aqui que quero chegar.
Quero chegar é no seguinte ponto: como pode um país desaproveitar um profissional com capacidades acima da média dos estudantes? Como não se criam condições para que fiquem em Portugal?
E com isso relaciono aquela questão, que felizmente ficou às claras nesta semana, graças ao nosso Ministro Martins da Cruz e sua filha. E é em todo o lugar assim, no país das cunhas e dos clientelismos.
Afinal é mesmo verdade a história dos filhos e enteados.
E podem ter a certeza que o Manel faz falta ao mundo jurídico português.
Não tenho dúvidas nenhumas disso.

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